Deltarune e a rara Capacidade de Fazer Sorrir

Há seis anos atrás, o nome Toby Fox tornou-se amplamente conhecido com o lançamento de Undertale, um jogo recheado de paixão, colorido pelos mistérios deixados no meio do caminho e apoiado integralmente por uma extensa e diversa comunidade. Com uma história relativamente curta, o desenvolvedor foi capaz de deixar uma impressão única com seus personagens, sua música e suas mensagens de compaixão e clemência. Três anos depois, Toby Fox lança de maneira discreta seu próximo projeto: Deltarune, um anagrama da obra anterior, sinalizando uma nova história formada a partir dos alicerces de Undertale. Contudo, na época, tínhamos acesso apenas ao primeiro capítulo da narrativa. Então, Toby Fox surpreendeu a todos novamente anunciando o segundo capítulo dois dias antes de seu lançamento, essa semana, e a partir dele o desenvolvedor demonstrou uma vez mais sua rara capacidade de fazer sorrir.

Falar algo novo sobre Undertale parece ser uma tarefa hercúlea quando levamos em consideração sua grande popularidade, mas é importante ser feita uma pequena retrospectiva dele antes de mergulharmos em Deltarune. Quando um humano cai em um mundo desconhecido, solitário e recheado de monstros, o jogo propõe uma escolha: seguir as palavras de Toriel, uma guia materna que ensina a acolher o outro, ou trilhar o próprio caminho, submetendo o outro, deixando o diálogo de lado para abraçar a morte. De forma inovadora, a obra possibilita ao jogador escolher a forma como a estrada irá ser pavimentada, seja fazendo novos amigos ou seja guiando-se pela macabra solidão.

No primeiro capítulo de Deltarune, no entanto, Toby Fox estabelece novas regras ao quebrar as antigas. Tudo se inicia com uma tela de criação de personagem, que logo se revela um truque, a fim de deixar claro que, aqui, suas decisões não importam. Apesar de personagens tirados diretamente do jogo anterior e dos vários "ecos" aqui encontrados, incluindo afetos e desafetos, o protagonista, Kris, é empurrade em direção a um novo abismo, criado a partir da dualidade do mundo: luz e sombras. Lá, faz novas amizades e embarca em uma jornada onde, de fato, suas decisões não importam. Mate ou poupe seus oponentes, aqui não há consequências tão significativas.

De toda forma, ao ter em mãos o tão aguardado capítulo dois da história de Deltarune, uma alegria imensa surgiu. É curioso, afinal apenas no ano passado joguei pela primeira vez os anteriores, mas ainda assim a magia do desenvolvedor se manifesta muito rapidamente e de forma universal. Seu humor é leve, mascarando os temas delicados com um otimismo distinto, fazendo qualquer personagem ser interessante. Vilões ou companheiros, todos têm a possibilidade de manifestar suas personalidades e demonstrar seus interesses. Dessa forma, não é preciso ter consciência de um fim para agir de forma agradável. A visão de Toby Fox é clara: qualquer moralidade é constituída de escolhas, a todos os instantes. Suas escolhas não precisam ter consequência para elas serem voltadas ao carinho e ao acolhimento, porque é a própria consciência do ato que nos faz deliberar.

Tenho por mim que é em tal sistema de escolhas que a narrativa de Toby Fox pode brilhar tanto. Ao ter tal nível de controle, cada momento de sua escrita memorável se torna ainda mais impactante, e os personagens ganham ainda mais níveis de complexidade. E é assim que, em meio das escolhas incessantes, os momentos cômicos aparecem como uma forma de colorir o mundo mágico onde nos encontramos, até a imersão chegar a um estado tão profundo em que uma alegria genuína aparece dentro de nós.

O desenvolvedor tem uma rara capacidade de fazer sorrir. Não um sorriso frouxo e tímido, mas um sorriso sincero, quente e íntimo. É impossível não se emocionar com tudo que é colocado aqui, porque existe uma certa magia ao redor de sua criatividade impressa em cada detalhe da obra. É uma experiência necessária, em todo caso, afinal são muito poucos que sabem fazer algo do tipo.