Desmobilização pelo Medo
- Lucas Barreto Teixeira
- 7 de set. de 2021
- 4 min de leitura
Poucas são as armas de controle tão eficiente quanto o medo. Temer não apenas pela vida, mas pela integridade social e por um determinado estilo de vida, é o suficiente para fazer silenciar um grupo ou mobilizar outro a qualquer tipo de ação. No Brasil, não faltam exemplos em nossa história marcada por horrores e contradições: o medo de uma ideia disforme de "comunismo" fez Getúlio consolidar seu Estado Novo, Jango ser deposto e Bolsonaro ser eleito, ao mesmo tempo em que o medo da retaliação das elites silenciou lideranças e manifestações populares. No dia de hoje, o medo mobiliza fanáticos a lutarem por seus direitos de serem mesquinhos, ignorantes e intolerantes, ao mesmo tempo em que desmobiliza aqueles que acreditam, de alguma forma, que não há mais condição de se dar poder a vozes como as que se encontram no poder.

Sete de Setembro de 2021 parece estar entrando para a história. Talvez não da forma como se é esperado. O governo de Jair Bolsonaro, essa tragédia anunciada desde sua ascensão nas redes sociais como um tolo de baixíssimo caráter e intelecto, marcha a passos firmes em direção ao abismo do esquecimento e desprezo, deixando para trás centenas de milhares de mortes evitáveis ao longo dos últimos dois anos, mas carregando a infâmia, verbas desviadas com suas rachadinhas e seus esquemas envolvendo a compra de vacinas, além da corja de seus seguidores fanáticos. E hoje, em meio a tais escândalos e com a fome espalhando sua odiosa presença nas casas de todo país, sua corte indecorosa jogou suas últimas cartas, em uma arriscada aposta que colocará tudo a perder, em qualquer sentido que o movimento seja analisado.
Já estão sendo muitas as imagens que circulam nas redes sociais, e é de se esperar ainda mais daqui para frente, mas todas prezam em despertar o medo. Estou disposto a aceitar que, de fato, em questão de mobilização social é possível dividir a população em duas: os que apoiam medidas autoritárias para que o medíocre permaneça no poder e aqueles que não encontram, na imagem grotesca do fracasso, uma representação válida. Nesse sentido, o medo é utilizado para menosprezar o outro, em um combate de narrativas alimentada pela mera especulação. Por isso, devemos nos dirigir aos fatos.

Na manhã dessa terça-feira estive presente no belíssimo ato no Centro do Rio de Janeiro. Em meio às construções coloniais e às barraquinhas de alimento de trabalhadores, uma multidão multifacetada se proliferava com bandeiras de causas sociais e portando ordens políticas. Após mais de dezoito meses em isolamento, ver em minha frente tamanha multidão causou-me choque, claro, mas todos ali presentes pareciam entender o risco de se expor em meio a uma pandemia: a pestilência não causa tanto temor quanto à ameaça crescente contra os pilares de nossa frágil democracia.
Poucos minutos antes de sair, no entanto, um medo atípico se apossou de mim. Desde quando acordara, imagens e vídeos em redes sociais alertavam os riscos de sair no dia de hoje. Em Recife, promessas sussurradas de ataques com armas brancas contra manifestantes. Em Brasília, ondas da decadência juravam se chocar contra indígenas que, bravamente, lutam por suas terras. Em São Paulo, esperava-se uma bomba de verde-e-amarelo capaz de quebrar o concreto da Paulista. Mesmo temeroso, decidi sair apesar dos riscos, encontrando, em meu caminho até o ato, picapes com bandeiras brasileiras, reluzindo as cores imperiais e espalhando a ideologia positivista por onde passavam. Nas ruas, homens brancos corriam com camisas amarelas e bandanas verdes, aumentando cada vez mais meu temor. Ainda nas redes, várias vozes moderadas e progressistas, ao menos na aparência, continuavam a relatar mais e mais situações de perigo que poderíamos estar nos expondo. Tudo isso para, no fim, depararmo-nos com o fracasso total e absoluto de Bolsonaro nas ruas. No fim, por mais barulhento que seus seguidores sejam, eles são poucos, frágeis sobre seus egos imensos e fundo demais no poço do fanatismo para encararem a realidade como ela se apresenta.
O medo, no final das contas, desmobiliza. São tantas promessas vazias e tantos alto falantes em redes sociais que é muito difícil entender como a ação é possível, além de extremamente necessária. Se a corja bolsonarista se reveste do medo que os assola na iminência de sua ruína, precisamos nos revestir com a mesma esperança e alegria vista nas ruas. O presente governo respira apenas por máquinas, no caso alimentadas por latifundiários e empresários da Faria Lima, e tal percepção deve ser aceita por um todo. Sem um empurrão, ele permanecerá lá, na beira do precipício, amarrado por símbolos ultrapassados, que devem cair junto a ele. Caia, Bolsonaro, e leve consigo a bandeira de uma independência realizada por nossos colonizadores! Leve consigo os genocidas do passado, de Borba Gato a Geizel, caia ao lado da mediocridade da classe média mesquinha brasileira, leve Olavo e Weintreub, e nos deixe com aquilo que faz, do Brasil, Brasil: artistas "vagabundos", a caridade "de comunistas" e o orgulho "de mimizentos". Nós vamos nos virar muito bem sem a sombra do medo por trás de sua soberba.
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